Comissão Europeia quer simplificar legislação ambiental

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Cátia Vilaça
Está aberto até 10 de setembro um convite à apresentação de contributos tendo em vista a simplificação dos encargos administrativos na legislação ambiental. Ambientalistas apelam à participação para tentar evitar retrocessos
A ideia é simplificar sem perder de vista os objetivos da legislação. Para a Comissão, uma “forma fundamental de alcançar este objetivo consiste na simplificação do quadro regulamentar e na redução dos encargos administrativos, sem comprometer os respetivos objetivos políticos”.
Para cumprir este objetivo, a Comissão está a analisar a legislação ambiental para identificar atos legislativos com potencial “significativo” de simplificação de tarefas administrativas, sem afastar objetivos ambientais.
A fundamentar a recolha de feedback, ou “call for evidence”, estão objetivos genéricos de redução de encargos nos domínios da economia circular, das emissões industriais e da gestão de resíduos. Aqui poderá incluir-se a racionalização das obrigações de comunicação/notificação, o que pode passar pela supressão da base de dados SCIP (substâncias que suscitam preocupação nos produtos) no contexto da Diretiva-Quadro Resíduos; pela harmonização das disposições relativas aos representantes autorizados em matéria de responsabilidade alargada do produtor, em cada Estado-Membro no qual um produtor vende um produto abrangido pelas regras da responsabilidade alargada, bem como sobre a facilitação da comunicação de informações no domínio da responsabilidade alargada do produtor; pela racionalização das obrigações de comunicação de informações, eliminando-se a dupla obrigação de comunicar informações e promovendo-se maior digitalização da comunicação de informações no domínio da economia circular, das emissões industriais e da gestão de resíduos; e pela resposta aos desafios em matéria de licenciamento na sequência das avaliações ambientais, com base na experiência adquirida ao abrigo do Regulamento Indústria de Impacto Zero.
A Comissão Europeia não considera necessária uma avaliação de impacto a suportar estas medidas, já que as medidas de simplificação deverão apresentar “pouco ou nenhum impacto” nas políticas a que dizem respeito.
Embora a consulta seja aberta a todos, a Comissão considera a oportunidade potencialmente interessante para agentes industriais/económicos como PME, organismos públicos, nomeadamente os que têm responsabilidades na legislação ambiental, organizações não governamentais (por exemplo, grupos ambientais ou organismos de defesa do consumidor) e organizações internacionais, assim como para o meio académico.
Risco de acelerar ainda mais os impactos climáticos
Para os ambientalistas, as explicações não convencem, e um conjunto de organizações, entre as quais a WWF, juntou-se à campanha HandsOffNature, um apelo à participação nesta recolha de contributos, exprimindo os motivos pelos quais a legislação não deve ser alterada e, desta forma, mantendo a pressão sobre as instâncias europeias.
As associações temem que, caso esta simplificação avance, diminua o controlo sobre os poluentes industriais que contaminam a água, que a desflorestação seja facilitada e as emissões menos controladas, que as empresas deixem de ser obrigadas a limpar a sua poluição, deixando esse ónus para o dinheiro dos contribuintes, e que em consequência de tudo isto o impacto das alterações climáticas aumente ainda mais.
“Grande parte dessas participações que vêm sendo feitas para essa consulta pública são principalmente de empresas, ou seja, do setor produtivo, indústrias que querem a simplificação porque entendem que a legislação ambiental lhes coloca muitos entraves burocráticos”, nota Bianca Mattos, Coordenadora de Políticas da WWF Portugal, em declarações à Indústria e Ambiente.
A esta data, o pedido de feedback conta já com mais de 11 mil participações. E se há empresas a congratular-se com a intenção de simplificar a legislação e a sugerir caminhos para essa simplificação, há também muitos cidadãos europeus em nome individual a manifestar forte oposição.
Para Bianca Mattos, é mesmo de enfraquecimento da legislação ambiental que se trata. Se a ideia fosse desburocratizar, os caminhos seriam outros: informatizar, melhorar meios digitais, fortalecer recursos humanos. E lembra que as PME já beneficiam de um regime diferenciado, como acontece, por exemplo, no regulamento anti-desflorestação, de 2023, que prevê, entre outras disposições, verificações mais abrangentes para os operadores e comerciantes que não são PME. “Além disso, a própria Comissão Europeia disponibiliza diversos guias, diversas plataformas de treinamento que visam ajudar principalmente estas empresas”, acrescenta a Coordenadora de Políticas da WWF Portugal, que lembra que os estados-membros podem também tomar medidas para apoiar as suas PME. Bianca Mattos chama ainda a atenção para a insegurança jurídica que se abre de cada vez que este tipo de legislação é discutida, que pode até dissuadir as empresas de se adaptarem com receio de que a qualquer momento haja novas mudanças.
Por agora, os esforços concentram-se na mobilização para a resposta à “call for evidence”, mas caso a Comissão avance de facto com uma proposta de alteração da legislação, Bianca Mattos não duvida de que as organizações de ambiente se farão ouvir em Bruxelas e propor as alterações que considerarem necessárias.
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