O Elétrico 28: um verdadeiro safari em Lisboa (mas podia ser em Braga ou noutro local)

O facto é que a cidade vive: alimenta-se, respira, excreta. Esse metabolismo urbano vai a par do Elétrico 28, pelo qual no outro dia viajei novamente. O 28 vai de Campo de Ourique até ao Martim Moniz. Atravessa, ao longo do seu percurso, um ecossistema real. Uma multiplicidade de realidades e contextos que fazem da viagem um safari de conhecimento.

Ecossistema Urbano

O Elétrico 28 mostra bem o risco associado aos fenómenos naturais em Lisboa, em parte potenciados pela ocupação humana: zonas sujeitas a cheias rápidas, áreas afetadas por sismos e tsunamis em tempos passados, assim como locais de acentuado declive e elevada capacidade de transporte sólido. Isto tudo enquanto se atravessam paisagens urbanas diferenciadas - edifícios leoninos emblemáticos, espaços com valor conservacionista, elefantes arquitetónicos e outras espécies mais exóticas ou invasoras, alguns sistemas a tenderem para o seu clímax, em degradação acentuada. A fauna e flora mediterrânica também faz parte deste safari. Basta referir o Jardim da Estrela, um hotspot de biodiversidade avizinhado numa das paragens. Além de cisnes e gansos, ou da alfarrobeira e da palmeira das vassouras, a par de vegetação não endémica, ginko ou dragoeiros, muito mais existe. O que não observamos é também de um enorme relevo. Com efeito, a diversidade de espécies microbianas, no elétrico ou em biofilmes no seu habitat, nos coletores de águas residuais, que passam por baixo do 28, algumas a indicarem a presença de contaminantes químicos persistentes, será enciclopédica. No meio do percurso, não longe mas de forma mais fugaz, avista-se o Tejo, um ecossistema estuarino muito dependente da qualidade da bacia hidrográfica urbana e que, felizmente, continua a recuperar. Finalmente, viajar pelo 28 é também obter uma perspetiva de ecologia humana e das dinâmicas populacionais, em especial com bom tempo e ao fim da tarde.

Mobilidade (de volta ao passado) 

O Elétrico 28 é um safari documentado pelo ecossistema de Lisboa mas é mais, é um elemento central para a mobilidade urbana. A Câmara Municipal de Lisboa informou que vai mesmo reabilitar uma zona para apoiar a reintrodução da linha entre Campolide e Cais do Sodré. Ótimo. Esta mobilidade, recuperada agora, está de acordo com as mais recentes tendências, algumas vezes recuperadas como metro de superfície. Será por acaso que a fotografia selecionada para indicar a presença de Lisboa nos “100 Resilient Cities” mostra um elétrico (um elevador no caso)? Não creio. Em Braga, em 1914, inaugurou-se uma linha de elétricos que perdurou até 1963, quando foi desativada. Má decisão. O mesmo aconteceu noutras cidades portuguesas. Creio que seria uma iniciativa a equacionar, muito para além do saudosismo, e tal como se tem verificado pelo mundo fora, a reintrodução do elétrico moderno na cidade.

Entre produtores, consumidores e decompositores, considerando os fluxos de energia e materiais/resíduos e as suas interações múltiplas, a cidade é um exemplo paradigmático do ecossistema urbano. Neste contexto, a Eng.ª Dulce Pássaro, com a sua experiência e ponderação, congregou na IA um conjunto de intervenções de interesse para todos, merecendo destaque a entrevista com o colega Prof. Paulo Ferrão, por todas as razões.

Créditos da imagem: João Correia

António Guerreiro de Brito

Membro do Conselho Editorial / Presidente do Instituto Superior de Agronomia

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