A Europa aquece ao dobro da velocidade média global – o que podemos ainda fazer?

FOTO: geralt / pixabay

A Europa é o continente que aquece de forma mais acelerada – ao dobro da velocidade média global, ainda que com assimetrias regionais. Relatório sobre o Estado do Clima Europeu em 2024 apresenta “fotografia” dramática, com o Ártico a liderar o ritmo de aquecimento a nível global

“A adaptação não é uma opção, é uma necessidade”, afirmou a secretária-geral da Organização Meteorológica Mundial no briefing virtual de apresentação do relatório sobre o Estado do Clima Europeu, a 10 de abril. As principais conclusões justificam os apelos de Celeste Saulo: o ano de 2024 foi o mais quente de que há registo, e cada um dos últimos 10 anos tem sido, consecutivamente, o mais quente. Mas 2024 foi o primeiro ano em que a temperatura global média excedeu em mais de 1,5 ºC a temperatura pré-industrial. A meta do Acordo de Paris só será ultrapassada se este aumento se verificar ao longo de um período de 20 anos, mas nos cinco anos anteriores o aumento já estava em 1,3 ºC.

Também a temperatura do oceano atingiu níveis excecionalmente elevados em 2024, o que encontra justificação nos efeitos residuais do El Niño, que aconteceu no final de 2023, combinado com temperaturas record na maioria das bacias.

As concentrações atmosféricas de metano e dióxido de carbono continuaram a aumentar, e as ondas de calor estão a tornar-se mais frequentes e severas, com o sul da Europa a enfrentar cenários de seca generalizada.

Valência e um cenário condenado a repetir-se

Para além de ter sido o ano mais quente de sempre, em 2024 assistimos às maiores cheias desde 2013, com 30 % dos rios europeus a exceder o limite elevado de inundação e 12 % o limite severo.

Em outubro, durante as cheias de Valência, foram batidos recordes nacionais de pluviosidade para os períodos de uma hora, seis horas e 12 horas. Pelo menos 232 perderam a vida num fenómeno associado à DANA (depresión aislada en niveles altos), em que o ar quente e húmido do Mediterrâneo é empurrado para a costa espanhola, gerando poderosas tempestades. Durante o briefing, Carlo Buontempo, diretor do Copernicus Climate Change Service (C3S) frisou que Valência não é caso isolado e estes fenómenos podem agravar-se quando temos temperaturas elevadas, que por sua vez conduzem a maiores níveis de humidade no ar e, por fim, a chuvas mais intensas. Aliás, logo em outubro, Ernesto Rodríguez Camino, da Asociación Meteorológica Española, em declarações à Science Media Centre España, dizia que associar um evento particular como este às alterações climáticas requer estudos a posteriori, mas não duvida de que num contexto de alterações climáticas, eventos como este serão cada vez mais frequentes.

O Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas já alertava para esse cenário em 2021, prevendo que a precipitação extrema e as inundações aumentassem na Europa. As principais tendências observadas têm padrões sazonais e regionais. Em 2024, foi a Europa ocidental a experimentar condições mais chuvosas do que a média, com algumas regiões a ter o ano mais chuvoso de sempre.

Contraste leste-oeste

No sudeste europeu, foi o calor e a seca a marcar passo. Em julho, registou-se a mais severa onda de calor na região, que durou 13 dias com uma anomalia de 9,2 ºC, que afetou 55 % da região. Mas não foi a única: após uma Primavera mais quente do que o habitual, houve seis ondas de calor na região. Entre 1 de junho e 5 de setembro, houve 43 dias com ondas de calor. O número de noites tropicais, ou seja, aquelas em que a temperatura não baixa dos 20 ºC, também registou recordes. O contraste leste-oeste pode ser explicado por alterações na circulação atmosférica, segundo explicou Samantha Burgess, diretora-adjunta do (C3S) e a alternância entre sistemas de alta e de baixa pressão.

Inteligência Artificial no combate aos incêndios

O risco de incêndio manteve-se na média ou ligeiramente acima da média no território europeu em 2024, mas Portugal contribuiu com cerca de 110 mil hectares ardidos em apenas uma semana (os incêndios de setembro), o que representou cerca de um quarto da área ardida em todo o ano no continente europeu.

Sendo este um cenário recorrente em Portugal, a Indústria e Ambiente questionou que tipo de medidas poderiam ser adotadas para o mitigar. Florence Rabier, diretora-geral do Centro Europeu de Previsões Meteorológicas de Médio Prazo (ECMWF) colocou a tónica na gestão e no recurso a melhores ferramentas de monitorização, adiantando que a organização tem uma nova ferramenta de previsão da probabilidade de incêndio baseada em inteligência artificial, que ainda não está largamente distribuída mas baseia-se na observação do fogo e em predições alimentadas por dados para tornar a previsão de risco de incêndio mais rigorosa.

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