Nova Mobilidade

  • 16 outubro 2017, segunda-feira
  • Gestão

Este não é um artigo técnico. Vou escrever sobre uma questão que nunca foi objeto da minha atividade profissional, mas afeta quem entra e sai todos os dias duma grande cidade, como era o meu caso. Para o efeito, vou restringir o âmbito desta minha reflexão à mobilidade das pessoas dentro dos centros urbanos e em movimentos pendulares de entrada e saída diárias. Afinal, o que queremos é deslocarmo-nos com rapidez, conforto e de forma acessível!

Como sabemos, a Mobilidade arrasta uma série de efeitos económicos, orçamentais, sociais e ambientais.

Económicos, porque existem inúmeras atividades ligadas à fileira dos veículos de transporte, desde o fabrico à venda, passando pela manutenção, seguros e combustíveis até ao seu desmantelamento final. Orçamentais, porque a tributação associada aos veículos e aos combustíveis é muito relevante. Impostos sobre os veículos (IA, IVA, IUC), tributação autónoma sobre as empresas (CA) e impostos e taxas sobre os combustíveis (em qualquer opção). Sociais, porque existe muito emprego nesta atividade, mas há também um excesso de tempo perdido nos percursos e nas ligações, que seria mais bem alocado a outras atividades com impacto no bem-estar social, designadamente à família, ao desporto, à cultura, a participação cívica… Ambientais, porque os veículos de transporte, por razões diversas, se desenvolveram num contexto desfocado das questões ambientais, desvalorizando riscos associados à exploração e ao transporte dos combustíveis fósseis, à saúde pública ou à poluição no edificado urbano.

Recordo que já em finais do Século XIX (dezanove, não me enganei!) foram organizadas corridas de veículos automóveis elétricos e, poucos anos depois, o grande revolucionário do setor automóvel, Henry Ford, fez algumas tentativas para o seu desenvolvimento... Um século depois, estamos de novo à procura da solução! Mas isso é outra história!...

Pese embora a Mobilidade passe pelos veículos, melhores veículos e melhores fontes energéticas não significam, por si só, melhor mobilidade. Várias ideias já concretizadas ajudaram a melhorar partes do problema - novos túneis, novos parques de estacionamento internos, estacionamento pago, acesso dificultado a veículos “velhos”- e todas elas fazem sentido, cada uma de per si. Mas o problema subsiste!…

Perdoem-me a ousadia, mas julgo que a questão não se resolve encontrando soluções para partes do problema, nem proibindo a entrada de veículos, mas sim integrando um conjunto de soluções complementares, sem prejudicar a vida das pessoas nem a tornar mais onerosa! Difícil? Talvez, mas não impossível! Em minha opinião, seriam necessários 3 passos:

Primeiro, perceber a causa do problema.

Há excesso de carros nas grandes cidades, que inviabilizam uma circulação dos transportes públicos mais rápida.  

Mas a inversa também é verdadeira: os transportes públicos não oferecem um serviço de qualidade (ligação, pontualidade, horário, conforto e preço), tornando o transporte individual uma alternativa competitiva. Sendo as duas verdadeiras, será preciso mexer nas duas porque estão correlacionadas.

Segundo, definir bem uma estratégia, envolvendo preferencialmente os concelhos limítrofes e desenvolvendo as várias etapas, desde a sua conceção até ao resultado final, monitorizando-o e dando público conhecimento. A adesão das pessoas também depende da comunicação.

Terceiro, perceber que os problemas mais difíceis não se resolvem dentro dum ciclo político, exigindo consenso sobre uma estratégia, para que não seja alterada ou interrompida com cada novo governante.

Para concretizar, exponho meia dúzia de medidas potenciais, na sequência do que defendo:

  1. Acordar com os municípios vizinhos a criação de parques de estacionamento à saída dos mesmos ou no ponto de interface com o sistema de transportes públicos – medida prioritária;
  2. Conceber estes parques de forma a acolher um conjunto de serviços que facilitem a vida às pessoas, uma vez que são pontos de passagem obrigatória diária. Loja do cidadão, depósitos de reciclagem e outras conveniências e obrigações, maximizando o tempo dos utentes;
  3. Classificar estes parques como centros de apoio à mobilidade, elegendo-os para o apoio de fundos comunitários, ou outros, permitindo a adoção de tarifários de estacionamento simbólicos e valorizando-os com o aproveitamento de energia solar;
  4. Otimizar os percursos dos transportes públicos dentro da cidade;
  5. Adotar formas simplificadas de pagamento dos bilhetes/passes, tornando prático o uso dos transportes públicos;
  6. Criar incentivos à adoção de veículos de transportes públicos menos poluentes e de dimensão adequada aos percursos;O resultado esperado seriam cidades com menos veículos individuais e mais qualidade dos transportes públicos, maior adesão do público e condições para uma tarifa menor. Paralelamente, valorizava-se o tempo das pessoas, bem como a atratividade da cidade.

Parece-me certo que é preciso recriar a Mobilidade. Mas, previamente, temos de criar condições de sucesso! Este pequeno contributo não tem nenhuma pretensão, a não ser discutir ideias. Vislumbro já alguns sinais positivos…aguardemos pelos resultados!

Pedro Mendes, Consultor/ Economista. Foi Adjunto do Ministro do Ambiente e dirigente na APA e no ex-INAG

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