Entrevista a Eduardo Diniz

A quantificação do desperdício alimentar ainda requer aperfeiçoamento, mas os dados disponíveis já permitem perceber que é nas famílias que mais se desperdiça. Eduardo Diniz, coordenador da Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar e da Estratégia que dela saiu, pugna por uma abordagem integrada, que envolva a responsabilidade do consumidor, das superfícies comerciais e de entidades públicas.

A mudança de Governo, em março de 2024, repercutiu-se de alguma forma na Estratégia? Houve alterações metodológicas, orgânicas, ou outras mudanças relativamente ao que estava em vigor antes?

A própria estratégia estava em revisão. Nós entregámos o relatório da ”primeira” estratégia (2018-2021) ainda no final do governo anterior, portanto foi passado esse relatório e o pedido de orientações, com a nossa opinião, ao novo governo, para relançarmos agora a Estratégia Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar ”2.0”, e temos já muito trabalho feito.

O governo ainda está a avaliar essas propostas?

Nós fizemos um concept paper e tivemos orientações, e como a estrutura continua a existir, vamos começar agora consultas mais técnicas e já com documentação feita com a experiência adquirida. A primeira estratégia também foi criada ainda nem a definição de desperdício alimentar estava estabilizada. Não havia dados, havia uma intenção política. A questão do desperdício alimentar nasce em 2015 com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), no sentido de termos metas para, em 2030, reduzirmos em 50 % o desperdício alimentar. A própria União Europeia adota essas orientações da ONU e até é mais ambiciosa nos limites e começa todo um trabalho - nas políticas públicas, entre as boas intenções e pôr no papel, nem sempre é muito fácil. Só na definição do que é desperdício houve várias reuniões a nível europeu.

Há questões tão simples como saber se as cascas entram, se os ossos entram, se as espinhas entram. Mesmo a métrica do desperdício em cada país é muito aberta, ainda há muita harmonização a fazer. Não há uma métrica comum a todos os estados-membros. Essa parte teórico-legislativa, depois legislativa, depois quantitativa e depois de envolvimento dos parceiros foi demorada porque estes processos públicos são sempre complexos.

Com a primeira estratégia, as infraestruturas e os pilares estão, neste momento, assegurados porque não só a nível europeu existe uma plataforma europeia e reuniões europeias regulares, como saiu legislação sobre essa matéria. Internamente, também está cada vez mais divulgada a questão do desperdício. Há alguns anos era algo de que se falava sempre muito associado à doação, mas não como um problema ambiental, de sustentabilidade, de gestão de recursos - porque há todas estas dimensões.

Há uma componente de desperdício de recursos naturais e até uma questão moral, que é desperdiçar os alimentos. Como a cadeia alimentar é muito longa – começa na produção até ao consumo das famílias - há uma série de intervenientes a quem não podemos impor nada. Tem de ser por transparência e tomada de consciência. Grande parte dos consumidores não têm noção de que desperdiçam, acham sempre que é o outro que desperdiça. As pessoas acham que o desperdício está mais concentrado, por exemplo, nos restaurantes ou na indústria, e não é verdade, está muito concentrado nas famílias.

Neste momento já foi possível quantificar onde o desperdício é maior?

ED: Já temos agora dados, finalmente. A Comissão Nacional foi criada tendo na sua composição 18 entidades de nove áreas governativas, duas associações ligadas aos municípios e o Banco Alimentar. Na altura dividimos em subgrupos, um mais dedicado às questões da segurança alimentar e do controlo. Houve um trabalho muito interessante com a ASAE e a DGAV junto das entidades que faziam a doação, para explicar e ter manuais básicos, porque é muito bom fazer doação, mas tem de ser com segurança alimentar. Foram também criados grupos para as vendas, por exemplo para potenciar a venda dos alimentos em desperdício.

Têm aparecido muito mais agora os selos dos produtos com a validade a terminar – era um dos nossos objetivos, até com lineares próprios, mas depois fez-se um protocolo com a APED [Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição] e os resultados têm sido interessantíssimos. Muitas destas entidades nem tinham noção de que tinham uma ação sobre o combate ao desperdício alimentar. Há sítios onde era mais difícil atuar, enquanto não tivéssemos os números.

Os números nacionais estão acima da média da União Europeia, mas acho que aí também há maior necessidade de harmonização dos dados. (...)

Eduardo Diniz, Licenciado em Engenharia Agronómica e especializado em Economia Agrária,
Diretor-geral do Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral (GPP),
Coordena a Comissão Nacional de Combate ao Desperdício Alimentar

Leia a entrevista completa na Indústria Ambiente nº 150 jan/fev 2025, dedicada ao tema "Desperdício alimentar". 

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