Climate-Smart Mining: reduzir o impacto da tecnologia de renováveis sobre os recursos

A urgência da transição energética não deixa margem para hesitações. Cumprir o Acordo de Paris e limitar o aquecimento do planeta a 1,5 ºC a 2ºC até 2050 é um caminho cheio de desafios mas urgente. A tecnologia de produção e armazenamento de energia renovável é, contudo, intensiva em recursos minerais. Importa, por isso, limitar os impactos no solo, na floresta, nos recursos hídricos e nas comunidades locais que decorrem desta necessidade. A iniciativa Climate-Smart Mining, do Banco Mundial, apresentada ontem na Conferência APEEN2021 – Transição Energética e Sustentabilidade, propõe um caminho sustentável.

Fabricar os painéis solares, as turbinas eólicas e as baterias necessárias para produzir e armazenar a energia de que necessitamos vai moldar a oferta e a procura de minerais críticos num futuro próximo. As implicações deste processo serão sobretudo sentidas nos países em desenvolvimento, ricos em minério, que apesar de beneficiarem do aumento da procura vão ter de lidar com a pegada associada à atividade.

O Banco Mundial já se tinha debruçado sobre a questão em 2017, mas agora, no relatório Minerals for Climate Action: The Mineral Intensity of the Clean Energy Transition, evidencia ainda mais o problema e enfatiza a forma como as melhorias tecnológicas e a reciclagem podem impactar a procura de minerais. A iniciativa Climate-Smart Mining propõe-se ajudar os países em desenvolvimento, e ricos em recursos naturais, a beneficiar do aumento da procura e a gerir a pegada ambiental dessa procura.

Os stakeholders ligados ao minério e energias renováveis têm um papel vital na transição.

Já num relatório the 2017, o Banco Mundial tinha alertado que não será possível um futuro com bbaixo carbono sem minerais. Este evidencia ainda mais o problema, mas enfatiza a forma como as melhorias tecnológicas e a reciclagem podem impactar a procura de minerais até 2050.

Diferentes minerais, diferentes necessidades

Num cenário de aumento de temperatura em 2 graus, a produção de lítio, grafite e cobalto terá de aumentar mais de 450 por cento até 2050, comparativamente com níveis de 2018, para cobrir as necessidades tecnológicas de armazenamento de energia. No caso do alumínio e do cobre, a procura será menor mas em termos absolutos os números são muito significativos, com as necessidades de produção a chegar a 103 milhões de toneladas para o alumínio e 29 milhões para o cobre, em 2050. Qualquer falha no abastecimento pode comprometer a velocidade do desenvolvimento de determinadas tecnologias.

Cada mineral tem um risco diferente associado à procura, porque há materiais necessários a um conjunto alargado de tecnologias e outros que apenas são usados em algumas tecnologias específicas.  O cobre, crómio e molibdénio são usados numa vasta gama de geração de energia limpa e tecnologias de armazenamento e têm condições de procura estáveis porque não dependem do desenvolvimento de nenhuma tecnologia em particular.

Já o lítio, grafite e cobalto são necessários a um conjunto mais restrito de tecnologias e têm, por isso, maiores incertezas associadas. São minerais usados essencialmente no armazenamento de energia.

Ainda assim, a procura por grafite e lítio é tão elevada que a produção teria de disparar para cerca de 500 por cento até 2050 para ir de encontro a um cenário de aquecimento global limitado a 2 ºC.

A escolha da tecnologia e da subtecnologia, a substituição do material e as melhorias tecnológicas irão determinar a procura por minerais individuais sob diferentes cenários de baixo carbono. Os fatores que podem determinar os efeitos de substituição incluem dinâmicas de mercado, disponibilidade de minerais, melhorias tecnológicas e custos.

Num cenário de aquecimento até 2 ºC, o solar fotovoltaico irá determinar a maioria da procura por alumínio (87%) enquanto a energia eólica e geotérmica irão ser determinantes na procura de zinco (98%) e titânio (64%). Juntos, o solar fotovoltaico e o eólico são responsáveis por 74,2 por cento de toda a procura de cobre, com o armazenamento em baterias responsável por toda a procura de lítio e grafite.

Embora a reciclagem e a reutilização de minerais possa ter um papel determinante na redução de emissões, a extração continuará a ser necessária para fornecer minerais críticos. Além disso, as taxas de reciclagem sofrem variações determinadas pelos custos e por aspetos técnicos. A escassez de material apto a reciclar e reutilizar também dificulta a satisfação da maior parte da procura por estes meios.

A extração mineira também causa emissões

Apesar da elevada intensidade mineral das tecnologias renováveis, os gases com efeito de estufa associados são apenas uma pequena fração dos libertados quando se produzem tecnologias fósseis. No entanto, a pegada de carbono e materiais não pode ser ignorada. Ainda que a produção e operação de energia renovável e armazenamento seja apenas responsável por 6 por cento das emissões geradas pelas tecnologias fósseis, os autores do relatório estimam que venham a ser responsáveis por cerca de 16 gigatoneladas de emissões de dióxido de carbono equivalente até 2050, um valor similar ao das emissões de 2018 de China e Estados Unidos, e isto sem contar com as emissões associadas ao transporte dos minerais entre o local de processamento e o de fabrico (aqui, aproximar a produção tecnológica da extração teria vantagens).

Por isso, limitar a pegada ambiental associada à transição energética é uma dupla vantagem, porque além de ajudar a estimular o crescimento económico e reduzir o risco nos países que detêm os recursos, ajuda a cumprir as metas de Paris.

A iniciativa Climate-Smart Mining propõe responder a estes desafios trabalhando em conjunto com governos, parceiros de desenvolvimento, indústrias e sociedade civil para minimizar as novas emissões associadas à transição e trabalhar com os países detentores dos recursos no abastecimento destes minerais.

Os stakeholders ligados ao clima terão de trabalhar em proximidade com os produtores de minerais, incluindo aqui os países que detêm os recursos e a indústria mineira, para assegurar que as emissões são mitigadas.

Os players ligados à energia limpa têm um papel ao assegurar que as tecnologias de baixo carbono estão a ser produzidas de forma sustentável  e responsável e que a gestão de resíduos é tida em conta no final do ciclo de vida. O setor mineiro é responsável por 2 a 11 por cento do total de energia consumida no mundo, o que justifica a proximidade entre as duas áreas de atuação.

Os stakeholders mineiros devem envolver-se na redução da pegada da sua atividade. A inovação será importante para reduzir a quantidade de energia, água e solo necessários à extração destes minerais e reduzir a pegada do setor.

A iniciativa Climate-Smart Mining tem um potencial transversal, se for alicerçada numa governança sólida e num quadro regulatório adequado. São quatros os pilares que a sustentam: Mitigação Climática, com integração de energia renovável no setor mineiro, inovação nas práticas extrativas e eficiência energética na cadeia de valor mineral; Adaptação Climática, com gestão da paisagem associada à atividade mineira, de forma a reduzir o impacto na floresta, eficiência de recursos na cadeia de valor mineira e soluções inovadoras de gestão de resíduos; Redução do Impacto Material, com adoção de lógicas de economia circular para minerais de baixo carbono, reutilização e reciclagem de minerais de baixo carbono e gestão de baixo carbono da cadeia de abastecimento de minerais; Criação de Oportunidades de Mercado, ao retirar risco aos investimentos em minerais de baixo carbono, alavancar os instrumentos financeiros associados ao carbono e robustecer a gestão  de dados geológicos.

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