Modelação ambiental e também a educação: a utilidade de saber o ponto de partida e para onde vamos

A modelação matemática, independentemente das definições existentes, é um instrumento útil para a decisão, seja a que nível for. Esta noção de utilidade é fundamental na construção de um modelo - que mais não é do que uma representação abstrata, simplificada, de uma realidade atual ou futura – sendo que o grau de utilidade se mede pelo erro, ou seja, a distância entre os dados e a realidade. No caso das ciências e engenharia do ambiente, a modelação aplica-se a um sem número de domínios, como sejam rios e lagos, clima, ruído, biodiversidade, solos, tráfego, etc., mas também de escalas, desde a nano até à planetária. Entre outros aspetos, o melhor conhecimento dos processos e das variáveis chave associados a um determinado sistema ambiental e a correspondente análise da resposta sob diferentes pressões permite que as decisões se aproximem dos objetivos, no que designamos por “modelação ambiental integrada”1. Um dos exemplos da aproximação entre decisões e objetivos tem consistido no desenvolvimento de modelos climáticos progressivamente mais precisos, um dos casos onde melhor se mostra que a ciência progride e que as decisões e as políticas urgem. Lewis Carrol escreveu algo educativo nesse contexto, quando a Alice perguntou ao gato para onde ia a estrada e, face à sua confissão sobre o facto de estar perdida e não saber para onde queria ir, o gato ter-se limitado a dizer que quando não se sabe para onde se quer ir, qualquer caminho nos pode levar lá. A verdade é que saber o ponto de partida e compreender para onde queremos ir aumenta a probabilidade de chegar onde pretendemos.

Testar cenários para antecipar o futuro é, portanto, um dos aspetos mais interessantes da modelação matemática. Chegados a este patamar, permito-me fazer nova ponte com a realidade das universidades, as quais também carecem de exercícios de cenarização e modelação. O movimento de transformação da sociedade como o conhecemos parece estar exponencialmente acelerado, mesmo com as resistências sociais e políticas que conhecemos. Percecionamos que, mais do que a criação, preservação e transferência de conhecimento, a universidade tem mesmo de ser um espaço de integração, de criatividade e inovação, de multidisciplinaridade e flexibilidade, pois os desafios assim o exigem. As competências profissionais hoje requeridas pelo mercado abrangem a capacidade de análise, iniciativa para a inovação, envolvimento social ou inteligência emocional, as quais podem ser apreendidas pelos estudantes se as metodologias de ensino também tiverem essa perspetiva. A universidade não serve apenas para ensinar a exercer uma profissão e tem de ir mais além, o que exige ser mais do que uma fábrica de lecionação de licenciaturas/mestrados. Aliás, o advento das plataformas de ensino à distância, apoiadas por instituições de ensino sólidas e credíveis, pode fazer com que uma parte substancial das universidades, as mais especializadas ou as mais periféricas, se tornem redundantes. As outras, em volta, ficarão mais fortes. Um dos pontos de chegada da verdadeira universidade tem de ser o serviço de cidadania, a construção de valores (e direitos) humanos, não o atalho da inteligência artificial que já começa a estar entre nós. Saber onde queremos chegar ajudará a traçar o caminho em frente.

1 Laniak et al. (2013). Integrated environmental modeling: A vision and roadmap for the future. Environmental Modeling and Software, 39, 3-23.

António Guerreiro de Brito

Membro do Conselho Editorial / Presidente do Instituto Superior de Agronomia

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