Transição energética

Neste número da revista, em que diferentes especialistas escrevem sobre a Transição Energética, evoco Gonçalo Ribeiro Telles (recentemente desaparecido), o arquitecto que já na década de 1950 se destacava pela forma inovadora como idealizava os seus projectos: “a utopia e os pés na terra”.  Os jardins da Fundação Calouste Gulbenkian, o Jardim Amália, o corredor verde em Lisboa, por que sempre se bateu, materializam o labor dum homem sempre à frente do seu tempo, um dos primeiros a falar de Ambiente e a projectar tendo-o em conta, exigindo de si, e dos outros, que a intervenção humana sobre o espaço fosse motivada pela procura da felicidade e com vista à sublimação "da pujança da natureza compreendida na sua diversidade biológica e no ritmo de vida".

"As circunstâncias tanto são pessoas, como são factos, como são atitudes... eu vivo muito da circunstância, gosto de olhar para as coisas, gosto de sentir as pessoas, gosto de verificar a vida e isso é a minha circunstância, que sem ela eu não tinha ideias...". Este é o pensamento de Ribeiro Telles que me conduz o olhar, e o pensamento, para um conjunto de situações urgentes a que temos de aprender a responder: urgência no respeito da natureza; urgência na adopção dum modo de vida mais compatível com esse respeito; urgência na comunicação da necessidade de mudança; urgência de contribuir e acelerar a transição (energética); urgência em humanizar e harmonizar o crescimento económico, urgência em privilegiar a qualidade de vida e urgência em preservar o Ambiente.

A situação actual e global, de pandemia e receio da crise económica que se tem vindo a instalar, é muito desafiante: vai exigir-nos, enquanto comunidade, convicções profundas e escolhas sábias sobre os valores a preservar. E isto é muito mais do que política, planos estratégicos, roteiros, modas, é muito mais do que marketing… é uma verdadeira mudança de paradigma do nosso “anterior” modo de vida, hábitos de consumo, mobilidade, formas de sociabilização, etc.

A transição e a eficiência energéticas, o objectivo da neutralidade carbónica e as energias renováveis são possíveis. São a “utopia com pés no chão”, possíveis portanto. Nestes aspectos, Portugal está muito bem posicionado tanto pelo que já alcançou, como pelo potencial que evidencia. Sabemos fazer, sabemos como fazer, já não vai ser preciso criar do zero… basta continuar, acelerar, pôr (sempre) em prática. Eventualmente será preciso resistir à tentação do conformismo, do “voltar a ser tudo como dantes” e, para o evitar, é preciso comunicar com as populações, envolvê-las, divulgar.

Com este número, e com a valiosa colaboração da co-editora, Professora Tânia Sousa, a quem muito agradeço, pretendemos contribuir para o conhecimento (e para a divulgação) da Transição Energética e da sua relevância. Ao conjunto de convidados que generosamente aceitou contribuir com as suas experiências, cobrindo um alargado âmbito de temas dentro do tópico principal, deixo igualmente o meu reconhecimento e não posso deixar de agradecer a entrevista que o Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Energia, Dr. João Galamba, aceitou dar-nos.

Sobre energia, bem como sobre este momento, poderemos sempre tentar ter a visão optimista das oportunidades criadas. Oportunidades que surgem em contextos benignos, outros, terríveis e adversos… mas somos racionais e criativos e a Ciência, a Tecnologia e as nossas emoções dão-nos o suporte para as nossas decisões que, e recorrendo de novo a Ribeiro Telles, com as devidas adaptações ao tema em referência, escreveu: “"Aceitar com base da concepção do jardim ou da paisagem a ordem natural da natureza liberta da acepção da sociedade humana".

Não temos forma de “ver” e “confirmar” no futuro como irá passar-se… mas a certeza de que estas são as opções que se impõem. Penso no “Regresso ao Futuro”, filme em que uma imensa descarga de energia permite viajar no tempo. Vou procurar o DeLorean DMC-12 em que Michael J. Fox viajou e, com “utopia e pés na terra”, vou ao futuro e já volto para contar…

Até já!

Editorial da Indútria e Ambiente nº125 nov/dez 2020

Leonor Amaral

Diretora da Indústria e Ambiente / Professora na FCT-UNL

Se quiser colocar alguma questão, envie-me um email para info@industriaeambiente.pt

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