O valor das agriculturas saudáveis

O Colégio F3 - Food, Farming and Forest é uma iniciativa de doze faculdades da Universidade de Lisboa para promover uma convergência de competências e conhecimentos interdisciplinares nos domínios agrícola e alimentar. A sua constituição resulta da consciência de que muitos progressos tecnológicos foram alcançados nas últimas décadas mas, ainda assim, muito, mas muito mesmo, ainda estará por fazer face à dimensão dos desafios que a comunidade humana enfrenta, como indicado nos objetivos de desenvolvimento sustentável para 2030.

Um relatório editado no corrente ano pelo Programa Ambiental das Nações Unidas (UNEP) mostra a outra dimensão do problema; “...é estimado que 33% dos solos estão entre o moderado e o muito degradado devido à erosão, pelo menos 20% dos aquíferos estão sobre-explorados, mais de 80% dos inputs de minerais (e.g.: fosfatos) não atingem os consumidores e 29% da população de peixes ditos “comerciais” está sobre-explorada”. Assim, a intensificação sustentável, a reutilização de recursos para a produção, a logística para a eficiência e redução de desperdício, ou as dietas alimentares menos processadas, são exemplos de objetivos numa lista ainda longe de ser cumprida.

Precisa-se, portanto, de melhorar o diálogo entre os especialistas e as especialidades tradicionais mas, em simultâneo, ir bem mais além e atender às práticas sociais e a outras áreas menos comuns - direito, território, psicologia, história, arquitetura. A recente apresentação do programa de doutoramento ciências da sustentabilidade - recursos, alimentação e sociedade, coordenado pela Prof.ª Amélia Branco (Instituto Superior de Economia e Gestão, ISEG), ilustra a resposta transdisciplinar que pode ser proporcionada pela academia.

Um outro elemento que gostaria de salientar é aquele ao qual, recorrentemente, volto. O empreendedorismo no setor agrícola tem uma ótima oportunidade para mostrar o que vale nas cidades, onde vive a maior parte da população mundial. Com efeito, é ancestral a vontade humana em aumentar a segurança do abastecimento alimentar e reduzir a probabilidade da ocorrência de fenómenos climáticos adversos, agora conjugada com a perspetiva de usar menos recursos e minimizar as pegadas associadas à produção - carbono, água, nutrientes e fitofármacos.

As possibilidades tecnológicas começam a ser diversificadas e entre os pequenos sistemas “faça você mesmo”, as hortas urbanas e os megaprocessos de intensificação baseados em aquaponia, incluindo a aquacultura, todos têm o seu lugar, desde que devidamente regulamentados e controlados, claro. Existindo modelos de financiamento apropriados - como o leasing de infraestruturas, que já existe - todas as oportunidades poderão concretizar-se em iniciativas empresariais. Acrescente-se, ainda, opções disruptivas: note-se a proposta de produção agrícola em espaços urbanos abandonados, um projeto do Colégio dinamizado pela Prof.ª Sara Amâncio (Instituto Superior de Agronomia, ISA), que visa conjugar a inovação social e a reabilitação sustentável em parceria com a comunidade local.

A qualidade alimentar é aliada da qualidade ambiental, sem demagogias. O contrário não se deseja, nem a nós nem a ninguém. Concedamos, por isso, todo o valor às agriculturas saudáveis, do campo às cidades.

António Guerreiro de Brito

Membro do Conselho Editorial / Presidente do Instituto Superior de Agronomia

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